Ozéia Oliveira

Ozéia Oliveira
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segunda-feira, 24 de maio de 2010

Meus medos...




Tenho medo de me apaixonar. Medo de sofrer o que não estou acostumado. Medo de me conhecer e esquecer outra vez. Medo de sacrificar a amizade. Medo de perder a vontade de trabalhar, de aguardar que alguma coisa mude de repente, de alterar o trajeto para apressar encontros. Medo se o telefone toca, se o telefone não toca. Medo da curiosidade, de ouvir o nome dele em qualquer conversa. Medo de inventar desculpa para me ver livre do medo. Medo de me sentir observado em excesso, de descobrir que a nudez ainda é pouca perto de um olhar insistente. Não suportar ser olhado com esmero e devoção. Nem os anjos, nem Deus agüentam uma reza por mais de duas horas. Medo de ser engolido como se fosse líquido, de ser beijado como se fosse líquen, de ser tragado como se fosse leve.


Tenho medo de me apaixonar por mim mesmo logo agora que tinha desistido de minha vida. Medo de enfrentar a infância, o seio que criei para aquecer as mãos quando criança, medo de ser o último a vir para a mesa, o último a voltar da rua, o último a chorar. Medo de me apaixonar e não prever o que pode sumir, o que pode desaparecer. Medo de me roubar para dar a ele, de ser roubado e pedir de volta. Medo de que ele seja um canalha, medo de que seja um poeta, medo de que seja amoroso, medo de que seja um pilantra, incerto do que realmente quer, talvez todos em um único homem, todos um pouco por dia. Medo do imprevisível que foi planejado. Medo de que ele morda os lábios e prove o meu sangue.


Tenho medo de oferecer o lado mais fraco do corpo. O corpo mais lado da fraqueza. Medo de que ele seja o homem certo na hora errada, a hora certa para o homem errado. Medo de me ultrapassar e esperar por anos, até que eu antes disso e eu depois disso possam se coincidir novamente. Medo de largar o tédio, afinal eu e o tédio enfim nos entendiamos. Medo de que ele inspire a violência da posse, a violência do egoísmo, que não queira repartir ele com mais ninguém, nem com meu passado. Medo de que não queira me repartir com mais ninguém, além dele. Medo de que ele seja melhor do que minhas respostas, pior do que as minhas dúvidas. Medo de que ele não seja vulgar para escorraçar mas deliciosamente rude para chamar, que ele me vire para não dormir, que ele acorde ao escutar minha voz. Medo de ser sugado como se fosse pólen, soprado como se fosse brasa, recolhido como se fosse paz.


Medo de ser destruído, aniquilado, devastado e não reclamar da beleza das ruínas. Medo de ser antecipado e ficar sem ter o que dizer. Medo de não ser interessante o suficiente para prender sua atenção. Medo da independência dele, de sua algazarra, de sua facilidade em fazer amigos. Medo de que ele não precise de mim. Medo de ser uma brincadeira dele quando fala sério ou que banque o sério quando faz uma brincadeira. Medo do cheiro dos travesseiros. Medo do cheiro das roupas. Medo do cheiro nos cabelos. Medo de não respirar sem recuar. Medo de que o medo de entrar no medo seja maior do que o medo de sair do medo. Medo de não ser convincente na cama, persuasivo no silêncio, carente no fôlego. Medo de que a alegria seja apreensão, de que o contentamento seja ansiedade.


Medo de não soltar as pernas das pernas dele. Medo de soltar as pernas das pernas dele. Medo de convidá-lo a entrar, medo de deixá-lo ir. Medo da vergonha que vem junto da sinceridade. Medo da perfeição que não interessa. Medo de machucar, ferir, agredir para não ser machucado, ferido, agredido. Medo de estragar a felicidade por não merecê-la. Medo de não mastigar a felicidade por respeito. Medo de passar pela felicidade sem reconhecê-la. Medo do cansaço de parecer inteligente quando não há o que opinar. Medo de interromper o que recém iniciou, de começar o que terminou. Medo de faltar as aulas e mentir como foram. Medo do aniversário sem ele por perto, dos bares e das baladas sem ele por perto, do convívio sem alguém para me mostrar. Medo de enlouquecer sozinho. Não há nada mais triste do que enlouquecer sozinho. Tenho medo de já estar apaixonado.

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